sexta-feira, 19 de agosto de 2011

NOTÍCIAS DA ABEAD




15/08/2011

Crack escancara a falta de políticas contra as drogas

Especialistas criticam a falta de ações integradas para o combate do uso da droga e divergem sobre a eficácia na internação compulsória de crianças e adolescentes, que atualmente é praticada na cidad






Escancarada nas ruas a disseminação do uso de crack tornou-se um flagelo social diante da falta de políticas públicas voltadas para a questão das drogas. A estimativa da Or­ga­ni­za­ção Mundial da Saúde (OMS) para o Brasil é que existam 3% de usuários, o que im­plica em seis milhões de brasileiros. O Ministério da Saúde tra­balha com dois milhões de usuários.


Na busca por soluções e­mer­genciais, a internação com­pulsória de crianças e a­do­lescentes – adotada pela prefeitura de São Paulo – co­meça a ser discutida pelo país e gera polêmica. Até que pon­to o encaminhamento à força g­era efeitos na luta contra o vício?

Para a diretora da Divisão de Saúde Mental, da Secre­ta­ria Municipal de Saúde de Goiâ­nia, Heloiza Helena Mas­sa­naro, primeiro é preciso o­bservar a complexidade da pro­blemática do crack, que implica também o preconceito. Por se tratar de uma séria questão de saúde pública, ela acredita que medidas simplistas não conseguirão o efeito desejado.

Conselheira do Conselho Federal de Psicologia e especialista em Saúde Mental, He­loi­za avalia que é necessário, antes de tudo, o diálogo. “Te­mos que dar a possibilidade de escolha para os usuários. Internação compulsória é uma verdadeira prisão não autorizada.”

Na opinião da psicóloga, essas ações governamentais são políticas de higienização, que excluem e ferem os direitos humanos. “Não podemos pensar a saúde de uma forma reducionista, muitos menos a questão do crack, que tem um forte fator social. Estamos regredindo. Pegar à força dependentes químicos e jogá-los para fora do mundo é cobrir os verdadeiros culpados da crise.”

Segundo ela, a internação compulsória é uma violência, que não oferece garantias, pois o sujeito não participa do processo de tratamento. “Mesmo que o crack atinja todas as classes sociais, o problema é a injustiça social e a exclusão. A população deve entender que os dependentes químicos precisam de ajuda e as famílias também.” Dados recentes do IBGE apontam que 35,7% dos lares brasileiros possuam algum parente familiar viciado em crack.

O foco deveria estar nas estratégias para a mudança de comportamento, que englobaria atendimento médico, psicoterapia de grupo, uso de técnicas para mudanças comportamentais, incentivo à participação em grupos de ajuda, assistência social. Heloiza diz que também não podem ser deixadas de lado as ações contra o tráfico e os investimentos em educação.

Estudos da Universidade Federal da São Paulo (Unifesp) demonstram que apenas um terço deixa o vício e encontra a cura, outro terço mantém o uso e outro terço morre, sendo que em 85% dos casos são relacionados à violência. Os pesquisadores apontam também que não há nenhum tratamento medicamentoso aprovado para dependência de crack.

O presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead), Carlos Salgado, vê a internação compulsória como prioridade quando o dependente corre risco de vida. “Um exemplo é o de uma idosa retida ao leito, sem higiene, em situação de desnutrição e quadro infeccioso. Caso ela recuse atendimento, seus familiares e amigos vão levá-la mesmo a contragosto à atenção médica. Por que haveria de ser diferente para um adolescente em dependência grave de crack que recusa atendimento?”

A maior dificuldade enfrentada em manter o usuário de drogas em tratamento e no próprio atendimento, de acordo com Salgado, é a escassez de recursos clínicos que invade toda a a área da saúde. “Muito se discute em políticas públicas e muito pouco é implementado, pois as verbas necessárias são sonegadas pelo poder público, apesar da brutal carga tributária a encher cofres públicos.”

A superintendente de Aten­ção à Saúde, da Secretaria Estadual de Saúde, e presidente do Comitê de Enfren­tamento ao Crack, Mabell Socorro, também avalia que a internação à força cabe em apenas alguns casos. “Quando existe a vulnerabilidade social e o dependente já não consegue controlar o vício e afeta os familiares e a sociedade, a internação compulsória pode ajudar no processo de desintoxicação.”

Em relação às questões de saúde como desidratação, desnutrição e gravidez, Mabell vê as internações à força como prioridades para o salvamento da vida dos dependentes. “Temos que ter sempre em mente a necessidade de socorrer a vida dos pacientes, que estão vulneráveis. A internação em hospitais gerais também é importante para o organismo físico. As clínicas específicas só desenvolvem tratamentos psicológicos.”

Reinserção social

Como uma engrenagem, um tratamento contra o uso de drogas não está atrelado somente à fase de desintoxicação. Os especialistas avaliam que a reinserção social é um ponto crítico do processo. Ma­bell acredita que o diferencial está justamente nesta etapa.

Os dependentes, que saem das clínicas e dos hospitais, necessitam de motivação e acolhimento para voltar à sociedade. “Se não houver uma reinserção social, os dependentes acabam voltando bem piores para as ruas. É prioritário o fim do preconceito e mais informação à população.” Por isso, são nos tratamentos psicossociais que Mabell vê a solução para o fim da epidemia do crack.

A superintendente enfatiza a importância das campanhas de prevenção ao uso das drogas e principalmente, do crack. O trabalho da educação é alvo de eventos que são voltados para serviços informativos, como por exemplo, dos efeitos das drogas no organismo, danos à saúde física e mental, destruição familiar, crimes em geral.

De acordo com Heloiza, a reinserção só acontece se houver uma ruptura com os problemas sociais. “Não é um problema só de saúde pública. Antes de tudo, são problemáticas sociais de distribuição de renda e educação pública. A população é desinformada quando o assunto é sobre droga, principalmente no caso do crack.”

Integrado

Uma visão interdisciplinar para o tratamento contra a droga foi apresentada pelo Conselho Federal de Medicina, na última quarta-feira, 9, durante o lançamento das Diretrizes Gerais Médicas para Assis­tência Integral ao Usuário do Crack.

Elaborado pela entidade, o documento aponta para a necessidade de uma abordagem física, psicológica e social ligada também às questões legais e qualidade de vida num tratamento que vise a abstinência e prevenção de recaídas.

De acordo com as diretrizes, a situação demanda uma abordagem interdisciplinar e uma rede integrada de atenção psicossocial, que devem propor ações preventivas de sensibilização e capacitação dos profissionais de saúde e educação, bem como a identificação precoce e encaminhamento adequado dos usuários. Além disso, são previstas desintoxicações, tratamento psiquiátricos, estratégias de psicoeducação para trabalhar fatores de risco, reabilitação neuropsicológica e psicossocial e redução de danos.

Reforço para formação profissional

A falta de pro­fissionais ca­pa­citados é um dos maiores obstáculos para a­tendimento e tratamento dos de­­pendentes quí­micos. Em Goiás, para me­lho­rar a formação desses profissionais, a Universidade Fe­de­ral de Goi­ás (UFG), em parceria com a Se­cretaria Nacional de Po­lí­ticas sobre Drogas (SENAD), instala no próximo dia 18, o Centro Re­gional de Re­fe­rên­cia de For­mação Per­ma­nente sobre Dro­gas (CRR-UFG).

Segundo a coordenadora do CRR-UFG, professora Tâ­nia Maria da Silva, nem mesmo as universidades possuem matérias direcionadas para essa formação. No entanto, enfatiza que não existe um modelo ideal e nem mesmo uma fórmula má­gica de prevenção e tratamento.
Para o psiquiatra e presidente da Abead, Carlos Sal­­ga­do, os profissionais de saú­de são mais preparados para conter mecânica e farmacologicamente pa­cientes confusos em uma UTI, mesmo que sejam crianças. Mas, de acordo com ele, esses profissionais não costumam ter a mesma desenvoltura em quadros psiquiátricos, o que inclui os dependentes químicos.

Uma das primeiras atividades do CRR serão os cursos para formação de profissionais ligados ao Sistema Único de Saúde (SUS) e ao Sistema Único de Assis­tên­cia Social (SUAS) de Goiânia e do su­deste goiano.

A expectativa da coordenadora é de que o CRR-UFG se tor­ne uma unidade permanente da universidade, após a conclusão dos quatro cursos. Ela diz que a intenção é dar se­quên­cia aos trabalhos nos 42 municípios onde a UFG possui campus

Cursos
Para início dos trabalhos do CRR, quatro cursos se­quen­cias serão oferecidos por professores da UFG, da Uni­versidade Fe­deral de São Paulo (Uni­fesp), do SUS e do SUAS, com encontros quinzenais, às quintas e sextas-feiras.

O primeiro deles, Curso de Atualização sobre Inter­ven­ção Breve (IB) e Aconse­lha­mento Motivacional co­meçará ainda no dia 18. A intenção é a formação dos pro­fissionais para o uso da Intervenção Breve e En­tre­vista Motivacional, na abordagem ao usuário de risco de crack, álcool e outras drogas.

O gerenciamento de Casos e Reinserção Social de Usuários de Crack e Outras será o se­gundo. Neste, os profissionais das redes SUS e SUAS serão capacitados para desenvolver intervenções mais efetivas com relação à prevenção, promoção e reabilitação psicossocial de usuários de crack, álcool e outras drogas, a partir da integração entre os dispositivos assistenciais e a comunidade.

No Brasil, hoje existem 49 Centros Regionais de Refe­rên­cia que promovem cursos de capacitação à distância. O CRR-UFG será o primeiro a promover formação presencial, conforme informações da coordenadora Tânia Maria.

Fonte: Tribuna do Planalto









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